CENTENÁRIO DO NASCIMENTO DO TIO JOÃO BÚZIO

quarta-feira, 21 de dezembro de 2011

BOAS FESTAS


VOTOS DE UM
FELIZ NATAL E BOM ANO NOVO
PARA TODOS
OS TIOS E TIAS
PRIMOS E PRIMAS

Outros Natais

Para mim, o natal teve sempre um significado muito grande, muito por “culpa” do meu pai, que era um grande entusiasta da festa da família. Era ele que alegrava as Ceias com os cânticos ao Menino, tão tradicionais da nossa terra.

Já nasceu, já nasceu o Deus Menino,
com prazer e alegria
Já nasceu, já nasceu o Deus Menino,
Filho da Virgem Maria
A Nossa Senhora tem,
tem uma rosa no punho
Que lhe puseram os anjos,
a vinte e quatro de junho
Já nasceu, já nasceu o Deus Menino,
com prazer e alegria
Já nasceu, já nasceu o Deus Menino,
Filho da Virgem Maria
  
Além do mais, era a época em que avô Cebola mandava os cestos com as iguarias que no Norte não havia: figos acalcados e figos cheios, batata doce para as trutas, bolotas, amêndoas côcas e laranjas algarvias, grandes, de umbigo aberto. Abrir o cesto da Avô era um ritual que me ligava à cultura de origem.
O primeiro natal de que me lembro com nitidez foi um no início dos anos 60 (62 ou 63). Aí já  morávamos sozinhos, numa casa pequenina, a que ternamente chamávamos “caseta”. Lembro-me da minha mãe a preparar o jantar e de eu ter posto, bem cedo, na chaminé, a minha bota.  O tio Márim, perito em brincadeiras e partidas, começou a chamar por mim – Esperancinha, vem cá, o Menino Jesus  já passou! E eu, rebentando de felicidade, a correr para a cozinha, para ver o que o Menino me tinha deixado. Sai, então, da cozinha o Tio com a minha bota na mão, carregada de… cascas de batatas! Bom, o choro foi mais que muito. Mas, no outro dia de manhã, lá tinha os meus brinquedos.
Outro lembrado natal foi já na casa grande. Aí fazíamos sempre a Ceia no chão do quarto dos pais, por ser uma divisão muito grande, mas muito aconchegada. O meu pai gostava dos natais no chão, tal como fora habituado em casa dos avós, onde se comia e dormia numa alternância de celebração. Neste natal que recordo, tivemos a presença do Tio Tóine, da Tia Otília, das primas e da avó materna delas. A certa altura do jantar, buliçoso e divertido, o Tio começa a cantar canções que nada tinham a ver com a quadra. Uma delas era sobre peixes – o refrão era qualquer coisa como: e o maçacote também quer ser congelado, eu cá não, eu cá não… -  mas a maneira como o tio cantava levou-nos às lágrimas… de riso! Foi de rebentar!
Sem qualquer espécie de revivalismo, tenho saudades desses natais. Porque marcaram uma época em que o Natal era mesmo o aniversário do Menino Jesus e era ele que nos “oferecia” os poucos  presentes mas únicos. Porque era a quadra da família, no seu conceito mais puro, coletivo e partilhado.

domingo, 25 de setembro de 2011

O Filho mais velho - Tio Xico


Conheci-o em 1961, quando ele foi para Matosinhos. Tinha cerca de quarenta. Baixo, entroncado, de rosto vincado e moreno, e às vezes usava chapéu, acessório ainda comum nos homens na década de sessenta. Dessa época não me lembro de muitas coisas dele, pois não tinha a ligação que tinha com os outros tios, provavelmente porque era mais velho e não tinha as brincadeiras com os miúdos que os irmãos tinham.
Lembro-me mais  dos anos posteriores, quando vínhamos a Olhão passar uns dias, em Maio. Invariavelmente, quando chegávamos era a casa dele, na Almirante Reis, 117, que íamos primeiro. Curioso pensar agora, a esta distância de tempo, sobre algumas das coisas vividas em primeira mão, aqui na minha terra.  Eu tinha seis anos quando os meus pais resolveram fazer a primeira visita à terra natal, depois de terem ido para Matosinhos, e, quando cá cheguei, a maneira de falar das pessoas era-me totalmente desconhecida e até mesmo incompreensível, mas ao mesmo encantadora. E uma das pessoas que eu pasmava a ouvir falar era o Primo Miguelito. Para mim era como se ele cantasse a falar. Recordo que quando voltei para casa, levei dias a imitá-lo, para grande divertimento do meu pai. Outra vivência em primeira mão com o Tio e família  foi conhecer a Ilha da Armona. E por fim,  aquela coisa espantosa que era  comer uma carapinhada na esplanada da Gelvi, ao som da “Chiquita Banana” que brilhava num inimaginável ecrã ao ar livre! Bolas! Bons tempos! Grandes tempos!
O Tio Xico era casado com a Tia Lucinda, mulher alta e magra, cuja mãe, pequenina, tinha um sentido de humor apurado, sempre pronto para uma piada ou anedota.

No início de casados, os meus pais chegaram a partilhar uma casa com os Tios, no Beco do Nobre. Nessa altura já havia o Primo Xiquezinhe, nascido em 1944 e a Prima Esterinha, nascida em 1948. Depois, em 1954 nasceu o Primo Miguelito, e por fim em 1957, nasceu a Maria José, mas que só é conhecida por  Prima Zéa.
O Primo Xiquezinhe estudou em Faro, casou com a Prima Betinha e teve três filhos: a Ana, o Paulo e o Mário.
A Prima Esterinha, uma das caras mais bonitas da família da segunda geração, casou com o Primo Zé Manel,  e teve a Ana Paula e o Cláudio. Infelizmente, deixou-nos cedo de mais, em 1991.
O Primo Miguelito aprendeu a arte de trabalhar o mármore. Casou com a Prima Cidália e é pai da Prima Sandra e do Primo Miguel.
A Prima Zéa casou com o Primo Ilidinho e teve o Primo Ilídio e o Primo Nuno. Acrescento aqui que a Prima Zéa era a minha companheira de andanças quando cá vinha em férias, e depois mais tarde, quando morei em casa do Tio Márim. Éramos quase da mesma idade (tenho mais um ano que ela) e as amigas dela passaram a ser minhas também, nessa altura. Agradava-me esta prima pelo sentido de humor e desembaraço parecidos com o meu. Aliás o sentido de humor foi sempre o apanágio desta grande família dos Avós.
Quando regressei de vez a Olhão, lidei mais de perto com o Tio Xico e Tia Lucinda e confirmei a boa impressão que sempre tive deles.
O Tio Xico deixou este mundo em Março de 2000 e a Tia Lucinda juntou-se-lhe em 2007.

sábado, 3 de setembro de 2011

O Único Genro

Os Avós tiveram um único genro – o Tio Manuel Viegas – e esse facto fez dele mais um filho a juntar aos outros.
Conheci-o já assim, isto é, já bem entrado nos quarenta:

Era um homem de fala enrolada, mas culto e que falava crioulo (a língua de Cabo Verde) fluentemente. Gostava de poesia e até é capaz de haver por aí alguns dos poemas feitos por ele, em crioulo, que eu li há mais de trinta anos.
Era muito guloso, especialmente para as rabanadas do Natal. Por entretenimento, chegou a fazer algumas fainas de mar no barco do meu pai, protagonizando algumas brincadeiras e partidas que encarava sempre com boa disposição. Tinha uma particularidade única: embora o fizesse com bastante frequência, a ida ao barbeiro para cortar o cabelo era sempre um pesadelo – o barulho da tesoura nos cabelos provocava-lhe uma impressão enorme, às vezes quase doentia, que o deixava de mau humor (creio que era essa a única vez que tinha mau humor).
Nascido em 20 de junho de 1929, era um dos sete filhos (só masculinos) de José Viegas Cava e de Natividade Bonança. Cedo ficou sem os pais e por influência do meio-irmão mais velho, o Comissário Luciano Cava, entrou para a Polícia de Segurança Pública.
Casou com a Tia Necas no dia 23 de Fevereiro de 1957 e no início dos anos 60 foi para Luanda e mais tarde para Cabo Verde, onde integrou o corpo da PSP que fazia serviço no Campo do Tarrafal, na ilha de Santiago – antiga prisão política.
Aí conheceu Luandino Vieira e o respeito mútuo fez com que este grande nome das letras Angolanas lhe oferecesse o rascunho do seu primeiro livro de contos, produzido na prisão, escrito à máquina e encadernado com capas feitas das caixas de papel químico “Kores”.
Com a queda do Regime, o regresso de África foi inevitável. Foi então colocado em Lisboa, na esquadra das Mercês, no Bairro Alto, em Lisboa.
No final dos anos setenta veio para a esquadra de Olhão, como subchefe. Reformou-se nos anos oitenta. Faleceu no dia 23 de Fevereiro de 1992, aos 63 anos, no dia em que celebraria 35 anos de casado.

sábado, 20 de agosto de 2011

Os Filhos e Filhas

A década de 20 trouxe aos nossos Avós 4 filhos:  três rapazes e uma rapariga. O primeiro foi um rapaz, António, cuja fotografia está na página seguinte e que morreu antes de fazer  1 ano, os dois seguintes foram o Tio Xico e o Tio João, depois veio uma menina, a Otelinda da Conceição, falecida também em bebé, e a década fechou com o nascimento do Tio Manel.
Nas primeiras décadas do século XX, a mortalidade infantil era um facto muito presente na sociedade portuguesa, baseada, sobretudo, na falta de meios médicos na província, na pobreza endémica das populações donde derivavam escassas condições de vida. A nossa família não fugiu à regra, e o casal perdeu três filhos.
Na década de 30 chegaram a Tia Necas, o Tio Tóine, a Tia Maria Lucinda e o Tio Márim.
Na década de 40  nasceram  o Tio Russo e o Tio Celestino.
Estes filhos tinham características muito curiosas: uns morenos, de cabelos ondulados escuros, outros de tez branca e louros e o Tio Márim, moreno, lábios grossos e carapinha larga e confirmar a costela africana da Avó Cebola.
Aprenderam a ler e a escrever oficialmente os dois mais novos: andaram na escola e acabaram o ensino primário. A Tia Necas frequentou o ensino ministrado pelo Sindicato das Conservas e portanto já em idade adulta. O Ti Márim ainda frequentou a escola do Padre Delgado na mira das botas com que atraíam os garotos ao ensino, mas assim que as teve nunca mais lá apareceu. O Tio João frequentou o ensino particular em Lisboa, mas quando se mudaram para Olhão, o Avô já não o matriculou; no entanto sabia ler e escrever com muita correcção. Os restantes permaneceram analfabetos. Recordo aqui  um  facto curioso: O Tio Tóine resumia na perfeição todo e qualquer filme estrangeiro que fosse ver, embora não lesse uma palavra das legendas.
Todos estes filhos e filhas tiveram uma relação de excelência com o trabalho, até a Tia Maria Lucinda, “tecnicamente” inapta. O mar e a fábrica foram o reino deste grupo de homens e mulheres de bem.
Após a morte do Avô, ocorrida na Páscoa de 1960, o Tio João chamou a si a tarefa de contribuir para a orientação dos irmãos, no sentido de puderem constituir a sua própria família sem terem a preocupação do sustento da mãe viúva e da irmã incapaz e com uma filha, uma vez que o Tio Xico e a Tia Necas já tinham casado.  
Assim, em 1961/62 a Avó Cebola foi para a nossa casa de  Matosinhos com a Tia Maria Lucinda e a Prima Bibiana.

A Avó, a Tia Maria Lucinda, a Prima Bibiana e eu
Matosinhos
Nessa safra e nas três ou quatro que se seguiram juntaram-se os tios Xico, Manuel, Tóine, Márim e mais tarde o Tio Russo, depois de fazer a tropa na Póvoa do Varzim e o Tio Celestino, antes de ir para a guerra do Ultramar.


Da esquerda: Tio João, Tio Tóine, Tio Celestino, n/r, Tio Márim, Primo João Cebola
Matosinhos, após a morte do Avô
 A Avó Cebola foi a primeira a regressar a Olhão, logo seguida do Tio Xico. O Tio Manel regressou para se casar com a Tia Ermelinda. Em seguida casou o Tio Tóine, na Figueira da Foz, com a Tia Otília. No ano seguinte casou o Tio Márim com a Tia Salvina, a seguir casou o Tio Celestino com a Tia Manuela e por último o Tio Russo com a Tia Elvira.
Desse início da década de 60 tenho muito boas recordações. Aos domingos de manhã ia à missa com a Avó Cebola à Capela de Santo Amaro (as missas ainda eram em Latim) e à tarde comíamos tremoços à janela, a ver quem passava. Durante a semana era a azáfama da chegada de todos a casa depois de mais uma faina na traineira, seguida do almoço na sala, em volta de uma mesa carregada de gente divertida e faladora. Muitas vezes ia com a minha mãe, a Tia Lucília, à rua Heróis de França, a rua da doca pesca e onde ficava o armazém de redes do barco do meu pai, buscar o peixe para o almoço e lá encontrava os tios no café Palhaça, a ouvir os últimos discos da moda que saía em altos berros de uma velha jukebox! Vozes tão distintas como as de Tony de Matos, Fernando Farinha, Elvis Presley ou Marino Marini, debitavam as músicas do momento que todos sabiam de cor à força de as ouvir tantas e tantas vezes.
O Tio Márim e eu
Matosinhos
De sábado para domingo as traineiras não saíam pelo que íamos à noite ao café ver televisão. Lá iam os tios aperaltados, educados e apreciados por toda a gente , sempre prontos a pregar as suas partidas inofensivas mas que provocavam sempre muitas gargalhas. Era a época das séries de TV como “Bonanza” ou “Ivanhoe” ou “Mr. Ed”, seguidas atentamente por grandes e pequenos.
Mas os Tios também tinham as suas saídas sozinhos, os seus passeios, os seus amigos, como mostram as fotos.
Também havia momentos de grande aflição, como na noite em que foi ao fundo a traineira “Zé Maria”, onde o Tio João era o Mestre de Redes. Nessa traineira trabalhava o Tio Manel, que foi notícia de jornal por ter salvo o cãozinho que levavam a bordo. Felizmente não houve vítimas, mas lembro-me que foram horas aflitivas enquanto se esperavam por notícias via rádio.


A Traineira José Maria
 Foram realmente bons esses distantes anos!

quinta-feira, 4 de agosto de 2011

ATUALIZAÇÃO DO ARQUIVO FOTOGRÁFICO

Primos e Primas!

A partir de agora, a as fotografias postadas semanalmente (ou quase!) irão para o princípio da respetiva página. Assim, quando abrirem o separador não têm necessidade de correr a página toda. 

Hoje há material NOVO !  VAMOS LÁ ESPREITAR!

sábado, 30 de julho de 2011

Uma Família da Diáspora


E nos anos 20, o Avô e a Avó começaram esta grande família. Nas décadas de 20, 30 e 40 nasceu a prole: 12 filhos, 9 dos quais chegaram à idade adulta.
Os primeiros 6 nasceram entre viagens Olhão-Lisboa-Olhão. Antevia-se, assim, percursos de vida inquieta. Todos os filhos, na altura própria de cada um, sentiram o desejo de estar, partir e chegar. E essa diáspora alargou-se às gerações posteriores.
Lembremos, então, esses percursos: Matosinhos, Lisboa e Figueira da Foz foram os primeiros destinos de uma migração marítima que os filhos seguiram, nos anos 50 e 60, em busca de melhor vida. Os anos 70 trouxeram outras oportunidades e perspetivas de vida e a Europa abriu-se a uns (Alemanha) e África esperou por outros (Cabo-Verde, Luanda, Porto Alexandre). Todos os filhos orientaram as suas vidas fora de portas, mas todos regressaram às origens.
Os netos, bom, os netos não negaram a força da genética e também eles acolheram a inquietação da partida e da chegada. Os que estavam fora regressaram, os que estavam cá dispersaram-se pelo país (Lisboa, Açores) e por essa Europa (Suiça, Itália, Alemanha),  cumprindo uma vez mais a diáspora da família.
Martin  Luther King disse um dia “I have a dream” (Tenho um sonho), e eu, também filha da diáspora e regressada à terra onde um dia nasci, também tenho um sonho, ainda que tão distante de se poder cumprir: juntar todos os primos e primas sob o sol da nossa terra e perto da nossa Ria Formosa e celebrarmos, sem quaisquer diferenças, o elo que nos une.

terça-feira, 5 de julho de 2011

Portugal nos Anos 10 do séc. XX

A década de 1910 foi difícil para a grande maioria da população.

Os portugueses eram pobres, analfabetos, trabalhavam de sol-a-sol e normalmente passavam fome.
As famílias portuguesas, ricas ou pobres, têm muitos filhos, muitas bocas para alimentar. O que, no caso das mais pobres, significa ter de aceitar e até incentivar o trabalho infantil para ajudar no sustento da casa.
Ardinas
A escola não é uma prioridade: 75 % da população não sabe ler nem escrever.
Nesta década os trabalhadores conseguem conquistar a jornada das 8 horas de trabalho e um dia de descanso, o domingo, embora o patronato não cumpra.
As más condições de vida conduzem à emigração, especialmente para o Brasil.
Nomeio desta labuta ainda há tempo para namorar, cantar, visitar feiras e romarias.
Nasce-se em casa e cerca de 20% das crianças morre no primeiro ano de vida.
A tuberculose é a primeira causa de morte entre os jovens e adultos.
A pequena burguesia é composta por funcionários públicos, juristas, oficiais militares, marinha mercante e proprietários de pequenas casas comerciais ou negócios. Politicamente apoiam a República, acabada de entrar.  Frequentam o teatro, o cinema, a ópera, assistem a concertos, comem e vestem bem.
O futebol começa a ser uma prática desportiva popular. Portugal estreia-se nos Jogos Olímpicos.

Sporting - 1910
O automóvel banaliza-se nas grandes cidades, embora só pertença de muito poucos.
Num ritmo mais lento, Portugal vai acompanhando as revoluções estéticas e sociais: a emancipação feminina e os movimentos sufragistas encabeçam a liberalização dos costumes, as saias sobem, pondo a descoberto o tornozelo das senhoras;  a música e a dança ganham novos ritmos importados do continente americano – jazz, do norte, tango, do sul;  nas artes o modernismo ganha forma através do Cubismo e do Futurismo das obras de Almada Negreiros ou Mário de Sá Carneiro. 
Estala a I Guerra Mundial. Em 1916 é criado o Corpo Expedicionário Português para intervir no conflito. Dos 57000 homens enviados para França, só regressarão 35 mil.

Soldados portugueses nas trincheiras
A 1ª República gera desagrados atrás de desagrados. À instabilidade política junta-se a instabilidade económica e social. A população está descontente com o afastamento compulsivo da Igreja das suas vidas e revolta-se por ter de praticar a sua fé quase às escondidas. Então dá-se o fenómeno religioso de Fátima, que nenhuma repressão governamental  consegue parar.
Depois da I Guerra Mundial, dá-se a rutura social e política entre a pequena burguesia e a classe alta. Começam os tempos ainda mais difíceis em que só os mais abastados conseguem sobreviver. Entra-se definitivamente nos anos 20. São os AnosLoucos.

Portugal no fim do Século XIX



Taberna

Gente rica na praia

sábado, 25 de junho de 2011

Os Avós – Infância, Adolescência e Juventude

O Avô Xico passou a infância e adolescência em Lisboa, muito provavelmente a viver na zona ribeirinha de Pedrouços, pois que aí moravam os irmãos dele (setenta anos depois ainda lá morava a Prima Elvira, sobrinha do Avô) e para aí foi morar quando casou com a Avó Cebola. Seria aí que nasceria o primeiro filho do casal e, mais tarde haveria de nascer o Tio Manel . O meu pai, Tio João, foi para lá com poucos meses e lá haveria de andar na escola. Ao que parece a idas e vindas de Lisboa foram uma constante na vida do casal e só pararam com o nascimento da Tia Necas. O Avô Xico era aprumado. A fotografia dele de fato, com gravata e alfinete e completado com corrente no colete, mostra que tinha o que vestir.
A Avó Cebola passou a infância e adolescência aqui em Olhão. Foi à escola oficial. Sim, a Avó sabia ler e escrever. Ainda me lembro da sua letra nas cartas: aguda, levemente inclinada para a direita, com a grafia anterior a 1911: dois”t”, terminações em “ez” e “eza”, “i” em vez de “e”, “aes” em vez de “ais” (no plural), “Mattozinhos” em vez de “Matosinhos” , entre outras palavras. Era divertida e tinha boa voz. Foi dela que veio a nossa veia para as cantorias.
Pela data de nascimento do Tio Xico, e sabendo que antes dele já tinha havido um primeiro filho (ver fotografia)  os nossos Avós devem ter-se casado por volta de 1920.
Como se conheceram? Não é difícil imaginar: tendo os pais da Avó o negócio do aviamento dos marítimos, é de calcular que o Avô, andando ao mar, lá se fosse aviar também e conhecesse a filha mais velha do casal da loja.
Os primeiros anos de casados não devem ter sido maus a avaliar pela fatiota do primeiro filho: verdadeiramente um vestido de batizado de gente da classe média. Também a fotografia do Tio João, nu, sentado num sofá forrado, de um fotógrafo lisboeta, é prova de que as coisas não corriam mal.
Lembro-me de a Avó contar que uma das vezes que veio de Lisboa, os vidros e as loiças tinham vindo em arcas, embrulhadas em papel de seda.
Também o meu pai se lembrava bem da, digamos, raiva que sentira quando se mudaram para Olhão e de não ter aqui as condições que tinha em Lisboa, a começar pela ausência da escola, e como a dureza da vida o atirara para a faina do mar.
Porém, não se pense que esta inconstância na vida familiar era só produto da hesitação ou conflito pessoal do Avô. Não.
No início do século vinte, Portugal era um país politicamente desorientado , economicamente pobre e culturalmente atrasado. Os anos do pós- I Guerra foram muito difíceis e culminaram com a Grande Depressão, fenómeno de grave crise económica, iniciada nos Estados Unidos mas que depressa se alastrou ao Mundo inteiro, abalando de forma trágica os países pobres.
Portugal foi um deles.

domingo, 12 de junho de 2011

A avó Cebola – Parte II – Os Pais

A nossa avó Cebola foi uma criança posta na Roda dos Enjeitados na Misericórdia de Olhão.
Nasceu em 1897, mas foi registada na Roda em 1898.
A avó foi registada como Bibiana da Conceição. Assim o eram todas as meninas postas na Roda da Misericórdia. Algumas mantiveram  contacto pela vida fora e registo aqui dois desses contactos: a nossa  avó levava por primos o casal Guerreiro, que tinha uma casa de roupas na Rua do Comércio (agora aquilo pertence aos filhos e noras); ora essa primandade advinha do facto da esposa do senhor Guerreiro ter sido também uma menina da Roda, de nome Bibiana da Conceição, e ter mantido o conhecimento com a Ti Cebola. Uma outra senhora a quem chamava prima era a Tia Conceição Caixinha (por coincidência mãe de uma tia minha, mas materna), que também era Bibiana da Conceição e era menina da Roda do tempo dela.
Como se percebe, nesse tempo ninguém ficava traumatizado por ser adoptado. Era uma condição social, que beneficiava adoptados e famílias adoptandas. Eram muitos os casos aqui em Olhão. Quem nunca ouviu falar dos Calhabanas (avôs e tios desses que vendem peixe no mercado)? Esses irmãos e irmãos (quase vinte!)eram todos adoptados pelo mesmos casal, e mantiveram pela vida fora o vínculo de irmandade.  
Como mais tarde ela própria reconheceu (numa situação que depois logo contarei),  a avó Cebola era filha ilegítima de um senhor abastado (primo do Dr. Reis) que morava na Rua Teófilo Braga (Rua das traseiras da Câmara Municipal) e de uma criada de servir (creio que de Quelfes). A filha e a sobrinha desse senhor faleceram nos anos oitenta, solteiras e sem descendência. Ambas eram pessoas cultas e educadas que juntavam aos seus rendimentos os proveitos das aulas de piano. A filha, D. Conceição, era madrinha de casamento da minha sogra. Ainda a conheci e os seus traços fisionómicos eram muito semelhantes aos da nossa avó: rosto comprido, nariz volumoso e cabelo encrespado. Estes traços de raiz africana deram-lhes o apelido de “mulatas”, pois que, efectivamente, o pai era mulato ou cabrita.
Contava a minha mãe que um dia, indo ela e a avó na rua das lojas, cruzaram-se com uma mulher e a avó cumprimentou-a sem grandes alaridos. Era a mãe verdadeira da avó. Sim, a nossa avó Cebola sabia quem era a mãe e conheci-a. Mas, pelos vistos a sua relação com ela não passava do cumprimento formal.
Foi a avó Cebola adoptada por um casal, João Sebastião (conhecido pelo Caga Sangue) e Maria da Conceição. Confirmado pela prima Rosa, o casal tivera cerca de dezoito filhos, mas nenhum sobrevivera, quer à nascença quer na primeira infância. Então decidiram ir à Roda buscar uma criança que desse continuidade à família, na perspectiva de segurar o negócio de que eram proprietários. Assim veio Bibiana da Conceição, menina saudável, ocupar um lugar de destaque numa casa abastada. Contava a avó que, nas visitas mensais que era obrigada a fazer à instituição que a tinha recolhido, era sempre a mais bem vestida e apresentada, pelo que a mãe adoptiva recebia uma verba oficial (10 vinténs).
Este casal tinha uma venda em frente ao mercado da fruta: além da taberna, vendiam batata doce assada e tinham carros de mula para transporte de mercadorias. Para a época, início de 1900, era uma visão muito vanguardista do marketing comercial que viria a produzir, 70 anos depois, os supermercados! Numa altura em que Portugal era menos do que um país periférico, tal o seu fraco desenvolvimento económico, uma família ter estes proventos era muito significativo!
Dez ou doze anos, esteve a avó Cebola sozinha com estes pais adoptivos. Durante a Primeira Grande Guerra é que nasceram as duas filhas, que se conservariam vivas até idade avançada.

Fica assim composta a árvore mais próxima da avó:

quarta-feira, 8 de junho de 2011

A avó Cebola – Parte I – A Roda

Todos sabemos que a nossa Avó Cebola era enjeitada.Então vamos lá saber o que era isso:
No século XVIII, os conventos, Misericórdias e asilos recebiam crianças abandonadas pelas famílias. Sendo, na sua maioria, crianças indesejadas, fruto de relações ilegítimas ou até mesmo ilegais, eram abandonadas em grande segredo nessas instituições. Para isso havia um dispositivo rotativo, uma espécie de berço giratório, colocado nas paredes contíguas às portas principais. A mãe, pela calada da noite, com a cabeça e o rosto cobertos e com o filho bem embrulhado, pousava-o na "roda", pelo lado de fora, fazia-a rodar de modo a passar para o interior, e sem qualquer contacto com alguém, tocava uma campainha e desaparecia de seguida. Alguém do lado de dentro, ao soar a campainha vinha de imediato buscar a criança absolutamente anónima. A janela mantinha-se assim sempre fechada, com a abertura do tambor para fora ou para dentro, podendo ser rodada quando se fizesse girar a base (Roda).A mãe, evidentemente nunca poderia vir a reclamar a maternidade e a instituição (Misericórdia) assumia a educação das crianças ou garantia a sua adopção. Ninguém via, ninguém sabia a origem do menino ou menina. Era a chamada Roda dos Enjeitados. De tanto ser usada, a roda acabou por se tornar legítima chegando a ser oficializada nos finais do século XVIII e a receber a designação de Roda dos Expostos ou dos Enjeitados. O intendente geral da Polícia do Reino, Pina Manique, reconheceu oficialmente a instituição da roda através da circular de 24 de Maio de 1783, com o objectivo de pôr fim aos infanticídios e acabar com o horroroso comércio ilegal de crianças portuguesas na raia, onde os espanhóis as vinham comprar. A Roda dos Enjeitados passou a existir em todas as terras, vindo a perder a sua importância e uso com o advento do Liberalismo em Portugal, na primeira metade do século XIX.
No entanto, as desilusões, os acasos e as situações sociais nem sempre se resolvem por decreto e a Roda dos Enjeitados continuou a existir, de facto, até à primeira década do século vinte.

domingo, 5 de junho de 2011

A Avó Cebola

Falar da nossa Avó Cebola é como reunir os elementos para um argumento de filme ao melhor estilo: temos a criada de servir, rapariga nova vinda do campo para mudar de vida; um patrão, novo e casado, bem  parecido e socialmente bem enquadrado; uma criança, resultado de um momento carnal bem sucedido; e uma família de acolhimento, abastada e afectiva. Fim da primeira parte. Intervalo. A criança cresce imune à pobreza, torna-se uma jovem alegre e desanexada de problemas; casa-se numa família de bons princípios mas o marido, jovem honrado e íntegro, tem dificuldades em  encontrar o lugar certo do desafogo à medida que os filhos vão chegando. A Jovem esposa faz-se adulta e mãe trabalhadora de uma prole considerável, mas não perde a alegria e o sentido positivo da vida. Tem um casamento harmonioso que só termina com a morte do marido. Ela continua pela vida, amparando uma filha cujo destino lhe pregou uma trágica partida. Morre velha, rodeada pela imensa família a que deu origem. Fim.
A realidade ultrapassou a ficção. A vida da nossa adorada Avó Cebola foi mesmo assim. Passemos ao relato real.

segunda-feira, 30 de maio de 2011

Quando a Alcunha se tornou Nome Próprio

Posto que já recuperámos o fôlego depois do post anterior, continuemos com o Avô Xico.
Era conhecido por Xico Búzio. Tal alcunha não sei onde teve origem. Provavelmente já a traziam de Lisboa, pois que os outros irmãos assim também eram conhecidos. E a alcunha passou aos filhos, que eram conhecidos como Búzios. Demais, essa alcunha era tão intrínseca aos filhos, que trago à conversa este exemplo:
O meu pai, João, conhecido por João Búzio, foi chamado pela capitania do Porto de Olhão para fazer exame para a carta de Mestre Arrais. O carteiro encarregado de distribuir o correio na zona do Largo da Feira tinha uma carta endereçada a “João José André, morador na Travessa do Matadouro, nº17” e, como não conhecia este destinatário nesta morada, andou intrigado dois ou três dias. Sem poder reter a carta por mais tempo, lembrou-se de perguntar à Avó Cebola se conhecia aquele nome, pois que a morada sabia que era a dela. Então não é que a nossa avó afirmou desconhecer aquele nome e que se calhar a morada estava mal. O que valeu foi que a minha mãe, apercebendo-se da conversa com o carteiro, veio desfazer a dúvida deste e lá levou a carta para o meu pai. Ah! Ti Cebola, que sempre foste única!
Voltemos ao Avô. Cedo deixou de governar a vida nos galeões. Saltando entre Lisboa e Olhão, não apostou nem acertou numa vida de desafogo e os filhos foram chegando. Por orgulho, não aceitou a ajuda dos pais da Avó Cebola ( que viviam bem, muito bem mesmo).Teve um botezito e com ele fazia as fainas junto à costa ou dentro da Ria. O meu pai foi para o mar por volta dos seis anos e creio que o mesmo aconteceu com os irmãos, se não com todos, pelo menos com os mais perto em idade ( Tio Xico e Tio Manel). Depois , os filhos iam vender o peixe pelas ruas da Vila. Quando os filhos mais velhos casaram, foram os seguintes que angariaram o sustento da prole em conjunto com a Avó, já que o Avô era um homem doente. Sofria de asma.
Talvez devido a essa dependência, o Avô contrariou sempre os talentos dos filhos. Lembro aqui o meu pai, que chegou a frequentar a escola em Lisboa e quando a família veio para Olhão, teve que esquecer os livros entre os remos e as poitas do barco; ou o caso do Tio Russo, que tinha uma voz extraordinária e que ainda pensou fazer as audições para a antiga Emissora Nacional (era assim que começavam os cantores e músicos em Portugal), mas que foi derrotado pela firme recusa do pai.
O Avô era, efectivamente, um homem de horizontes curtos, e, pelo que sei, muito crítico em relação a tudo e a todos. Mas, por ser tão gregário, era muito chegado aos filhos. Em tempo de alguma fartura de peixe, nunca vinha da praça sem o lenço carregado de bolos para os mais novos. Aliás, o Avô gostava muito das crianças da família. Todos os filhos tinham alcunhas específicas consoante as suas características: o Xico era o quarteireiro, pela queda que tinha pelas camisolas aos quadrados (geralmente eram os tecidos mais baratos), o João era o cavalo raio,  porque era muito rápido a ir fazer os mandados, o António era (vá lá saber-se porquê!) o Diogo Alves, o Russo era o sangue branco, pela brancura da pele e pelo cabelo loiro, que aliás lhe valeu não uma alcunha mas um segundo nome, o Celestino ficaria sendo sempre o menino, porque foi o último e o que ocupou a cama dos pais por mais tempo.
E se comecei por falar da alcunha da família é com alcunhas que termino.

sábado, 28 de maio de 2011

Os Irmãos do Avô Xico

No principio dos anos 20 do século passado, o avô Xico Búzio e a avó Cebola casaram-se em Olhão.

O que sabemos do avô é que era oriundo de Lisboa, de uma família, provavelmente, de marítimos. Teve dois irmãos e três irmãs.

No quadro abaixo podem ver como se perpetuou esta ascendência:



Curiosidade: duas das irmãs do avô, a tia Mariana e a tia Baptista, foram casadas com dois irmãos, o tio Xico Nunes e o tio Zé Nunes.

Contrariamente à época em que viveram, toda esta geração teve poucos filhos e ainda menos netos, pois que alguns destes nem filhos tiveram, como foi o caso do primo Celestino e do primo Xico.Começando no irmão mais velho, este foi pai de uns primos direitos, os primos Galinhos. É capaz de haver por aí alguma descendência, netos ou coisa assim.
Do irmão Zé, temos ainda vivo o primo Zé Manel, pai do Zé Manel, cujo primeiro casamento foi com a nossa saudosa prima Esterinha. Para quem não sabia, sim senhor, eles eram primos em segundo grau. A mulher deste tio Zé era a tia Ester, considerada uma mulher lindíssima.
A mana Mariana foi a mãe do primo Xico, que esteve em Porto Alexandre muitos anos, e que era casado com a prima Joaquina (natural de Cabeceiras de Basto). Não tiveram filhos. A prima Clarisse também viveu em Angola e teve uma filha, a Maria Virgínia. A filha desta, a TeTé, vive no Porto.
A mana Baptista foi a que teve mais filhos.
A mana Amélia foi a que casou melhor. O marido era o tio Manuel da Marta, da Marinha Mercante. Viviam numa casa meio apalaçada (que eu ainda conheci) em Lisboa. Tiveram duas filhas. Uma delas era licenciada em Físico-Químicas (isto há mais de 70 anos!).

Esperancinha

Esta Casa é Vossa!

Olá Primos e Primas!

É um facto que só nos conseguimos reunir todos (ou quase) em duas ocasiões distintas - casamentos e funerais. E como os primeiros vão sendo cada vez menos e estes cada vez mais, ocorreu-me criar este espaço que vai ser a nossa sala de estar onde, sentados comodamente, poderemos conversar sobre a nossa família: factos , curiosidades, parentescos desconhecidos e o que mais vier à conversa.
E como numa boa reunião há sempre fotografias, irei apresentando algumas, esperando que vocês possam trazer também as vossas.

Pertencemos a uma grande família, que se renova década após década. Recordar os antigos e apresentá-los aos mais novos, não será má ideia. Para isso conto convosco, com a vossa visita e o vosso contributo.

Esperancinha